Quando não é pra ser...

Lis 

Desliguei o telefone, e comemorei. Um ano procurando emprego, poxa! Até que enfim!  

Depois que a entrevista foi agendada eu tive uma semana pra me preparar: pesquisei sobre a empresa, ensaiei respostas para as pegadinhas clássicas, escolhi a melhor roupa, conheci o local da entrevista com antecedência, descobri três linhas de ônibus que me deixam bem perto, e calculei que a minha menstruação acabaria antes, ou seja: sem cara inchada. Oba. 

Saí de casa pronta para conquistar a vaga. 

Cheguei lá com folga de meia hora, passou rapidinho, o tempo estava lindo. 

E tipo, era só eu. Não tinha concorrente. 

A entrevistadora me chamou, e daí devo ter ficado mais ou menos quarenta minutos conversando com ela; ela fez várias perguntas, quis saber mais sobre mim, e tal. 

O clima na empresa era tranquilo, com aquele silêncio das nove horas da manhã. 

E eu, cuidando da linguagem corporal, disfarçando muito bem o nervosismo, eu arrasei nas respostas, tirei dúvidas, consegui ser criativa e fugi de clichês. Brilhei. 

Só que não. Em quarenta e oito horas a resposta não veio. 

Não fui contratada. 


Agora olha só que impressionante: no mês seguinte outra vaga de emprego apareceu, desta vez num aplicativo que baixei no celular. 

Sem botar muita fé nisso, liguei e agendei a entrevista para daqui a dois dias, numa cidade vizinha, longe pra caramba. Gastei um dia pra tentar descobrir um ônibus que me deixava lá, e no outro eu teria que acordar cinco horas da manhã se quisesse chegar; Fiquei sem saber com qual roupa ir, a calça que eu queria estava meio suada; perdi uma hora experimentando várias roupas por causa do maldito inchaço pré menstrual. Custei fazer a maquiagem por causa do choro. Minhas sardas e olheiras gritavam, uma espinha se formava na lateral do meu nariz, mas eu já estava atrasada. 

Catei um punhado de biscoito e saí comendo pela rua afora. 

Perdi um ônibus, vazio. 

Quinze minutos depois veio outro, lotado, porque já começava a hora do rush. 

Gastei duas horas pra chegar lá na casa do caixaprego, onde mais três meninas, bem mais apresentáveis do que eu já esperavam pela entrevista. 

Pra piorar, choveu e eu não tinha levado sombrinha. E pra variar, a entrevistadora mandou um zap pra todas nós, avisando que demoraria um pouco por causa do trânsito.

Sem lugar pra assentar, ficamos espremidas debaixo daquela marquise ridícula de tão pequena. 

Todo mundo puxou papo com todo mundo, mesmo assim o tempo custou passar. 

A entrevista aconteceu na cantina da empresa. As faxineiras ainda estavam terminando de limpar o refeitório. As mesas estavam sujas. Era uma agitação, uns odores de lixeiras sendo esvaziadas, um entra e sai de gente, um sem-graceiro básico...
"Por que você ficou esse tempo todo sem trabalho, Lis?" 
"Oi...?"

Parecia um troço meio improvisado. Pelo menos o clima era bem descontraído. Mal tive oportunidade de abrir a boca. Senti que formulei frases bem idiotas, aliás. Não consegui esconder o nervosismo, eu esqueci de lembrar de parar de balançar os pés: a entrevistadora reparava tudo, tudinho. 

Fomos liberadas depois de quinze minutos. 

A chuva engrossou antes que eu conseguisse chegar ao ponto de ônibus, que nem era o meu.  

Cheguei em casa ensopada. O que me restava de esperança já tinha escorrido pelo caminho. 

Tomei um banho, amargando a perspectiva de um 2019 sem emprego, e sem um tostão no bolso. 

Fui tentar afogar minha frustração com um café bem forte. A preocupação era muito grande, não me deixaria ter o luxo de tirar um cochilo.  

Até que ouvi a notificação do Zap; fui aprovada. Salário maior que o da vaga anterior, e local próximo de casa. Oba!

Moral da história... Tá, não posso reclamar, mas parece que a vida faz a gente de trouxa. 😁